Não é raro encontrarmos um indivíduo que saiba que números racionais são aqueles que podem ser escritos na forma $\tfrac{a}{b}$, onde $a$ é um número inteiro e $b$ é um número inteiro diferente de zero.
A maioria deles talvez saiba que tais números podem ser escritos como uma expressão decimal finita (por exemplo $\tfrac{53}{20}=2,65$) ou como uma dízima periódica (por exemplo $\tfrac{10}{3}=3,333333333...$).
O que talvez a minoria saiba é explicar a periodicidade das dízimas, afinal porque é que todo racional não finito é uma dízima periódica?
O número racional (como sabemos, já dissemos e repetiremos), são aqueles que podem ser escritos na forma $\tfrac{a}{b}$, com $a$ e $b$ pertencentes ao conjunto dos números inteiros e $b$ diferente de zero.
Vejamos alguns exemplos:
Suponha, então, que você tem o número racional $\tfrac{a}{b}$.
Imagine que você quer efetuar a divisão para obter uma expressão decimal:
Como de costume, você vai obter um cociente e um resto:
(Obs.: na figura acima considere que há a necessidade de escrever um zero ao lado do resto r para efetivamente fazer a conta, mas vamos omitir estes zeros nas nossas figuras – mas eles estão lá!)
É claro que o processo não para por aí. A divisão continua até obtermos um resto zero e, quando isso ocorre, dizemos que a divisão é exata e obtemos uma expressão decimal finita:
Mas vamos supor que dividindo $a$ por $b$ não obtemos resto zero.
Importante: Note que o resto não pode ser um número qualquer. Ele deverá, necessariamente, ser menor do que o divisor. Portanto haverá $b-1$ possibilidades para o resto.
Suponha, então, que você fique dividindo e dividindo, aumentando os dígitos no cociente e não apareça um resto zero:
Sabe o que acontecerá?
Em algum momento haverá um resto repetido. Na verdade, no máximo o $b$-ésimo resto será repetido:
E a partir deste momento os dígitos do cociente começam a se repetir gerando o que chamamos de período da dízima:
E a conta prossegue... sem fim...
Vejamos, a seguir, um exemplo numérico pra melhor elucidar a ideia.
Suponha, então, que você tem o racional $\tfrac{14}{5}$. Imagine que você quer efetuar a divisão pra obter um valor na forma de uma expressão decimal:
Como de costume, você vai obter um cociente e um resto:
Continuando a conta:
A divisão continua até obtermos um resto zero e, quando isso ocorre, dizemos que a divisão é exata e obtemos uma expressão decimal finita:
Mas há casos em que o zero nunca aparece como resto, ou seja, casos em que não estamos lidando com uma expressão decimal finita (por exemplo no caso do racional $\tfrac{21}{13}$). Então, como estamos acostumados a afirmar, este número deve ser uma dízima periódica já que é racional e não é um decimal finito.
Observe (e isto é ponto chave da argumentação) que no caso da divisão de $21$ por $13$ o resto não pode ser um número qualquer. Ele deve, necessariamente, ser menor do que $13$. Portanto, neste caso, há $12$ possibilidades para o resto: $1$, $2$, $3$, $4$, $5$, $6$, $7$, $8$, $9$, $10$, $11$ e $12$.
Supõe então que você se depare com um caso em que fique dividindo e dividindo, aumentando os dígitos no cociente e não apareça um resto zero:
Perceba que, no máximo, o $13^\circ$ resto será repetido (pois como só há doze restos possíveis, a partir do décimo segundo, ou eventualmente até mesmo antes, haverá uma repetição):
Confira a conta na íntegra:
Note que o período desta dízima é $615384$.
Observe que, o que acabamos de ver, foi porque todo número racional ou é uma expressão decimal finita ou então é uma dízima periódica. Em resumo:
Se aparecer o resto zero então a divisão acabou e não há mais nada para acrescentar no cociente, logo obtemos uma expressão decimal finita.
Se não aparecer resto zero, então haverá uma quantidade infinita de restos (pois a conta não acabará) e portanto haverá um momento em que algum dos restos anteriores se repetirá (pois há um número finito de possibilidades para o resto: eles devem ser menores do que o divisor), logo o dígito a ser inserido no cociente será o mesmo que você inseriu quando o resto repetido apareceu pela primeira vez. A partir deste ponto todos os restos (e dígitos do cociente) começarão a se repetir periodicamente (e infinitamente).
Explicando melhor porque é que o tal resto sempre será menor do que o divisor: Note que se ao dividir $a$ por $b$ você obtém um primeiro dígito $q$ no cociente e um resto $r$ maior do que $b$, então sua escolha de $q$ foi errada. Você deveria, talvez, ter escolhido $q+1$ como o primeiro dígito do cociente (ou $q+2$ ou $q+50$ e isso depende de quão ruim foi sua escolha para $q$). Dito de ouro modo: caso sobre um resto maior do que o divisor então você está respondendo de maneia errada a perguntinha do fundamental “tem $a$ na tabuada do $b$? Não? Então qual é número que multiplicado por $b$ chega mais perto do $a$?” ou “tem $a$ na tabuada do $b$? Não? Então qual é o número que vem antes?” ou algo parecido.
Referência:
LIMA, Elon Lages. et al. A Matemática do Ensino Médio: Volume 1. 6. ed. Rio de Janeiro: SBM 2006. (Coleção do Professor de Matemática)
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Olá!
ResponderExcluirParabéns pelo blog, está muito bom! Quando eu era pequeno ficava encucado com essa questão da dízima, rs
Quando puder dê uma passada no Dados: http://dadosdedeus.blogspot.com
Abraços!
Realmente um post muito interessante, pois não encontramos normalmente em livros do ensino médio, só quando temos um contato no ensino superior, mas você mostrou que esse assunto é altamente acessível a alunos de todos os níveis.
ResponderExcluirParabéns pelo blog, sucesso.
http://gigamatematica.blogspot.com
Olá Dados, obrigado pelo elogio! Realmente estas questões de dízimas nos encucam em algum momento. Certamente passarei pelo seu Blog.
ResponderExcluirOlá Diego, muito grato pelo elogio. De fato este tema é pouco explorado em alguns livros. Sucesso a você e ao seu blog tbm.
Até +, Pedro Roberto.
Olá, Pedro e Caroline!
ResponderExcluirComo estão, meus amigos? Espero e torço que... tudo de bom!
Excelente post sobre a divisão! Como sabem, eu já postei também, sobre as "coisas misteriosas" da divisão e de certo modo, posso dizer que... na minha opinião, vocês, de maneira mais caprichosa, compactada e impactante, revisaram e complementaram aquele meu trabalho, portanto, meus parabéns e desejo-lhes... sucessos!
Um abraço!!!!!
Olá Francisco Valdir! A menos do tempo (que as vezes nos falta) está tudo bem!! Sem dúvidas, quando o assunto é divisão você é perito então muito obrigado pelos elogios.
ResponderExcluirAbraço.
Pedro R.
Boa Noite Pedro, excelente material, parabens!!!!. Estou realizando um trabalho e tenho uma questão que não estou conseguindo equacionar. É a seguinte: Como provar que a quantidade de núemeros racionais não périódicos em um intervalo de uma reta real é maior que os números com dízimas periódicas nesse mesmo intervalo?
ResponderExcluirGR ABS, Robson